O tema que, hoje, trago aos amigos que me honram com seu acesso ao "blogger", é sempre atualíssimo. É um grande prazer presenteá-los com genial matéria de autoria de eminente colega aposentado do Ministério Público de São Paulo. Espero seja de imensa utilidade e de agradável leitura pela riqueza de seu conteúdo. Confiram:
"A presidente do Supremo Tribunal Federal e do
Conselho Nacional de Justiça, ministra Cármen Lúcia, durante a palestra em que
abordou a liberdade de expressão na comunicação tecnológica, ampliou sua
exposição fazendo-a atingir a liberdade de imprensa e defendeu que “não há democracia sem imprensa livre, não há
democracia sem liberdade. Ninguém é livre sem ter pleno acesso às informações e
são os jornalistas, e a imprensa, a nossa garantia de que teremos sempre as
informações prestadas, o direito garantido”.
1. A liberdade de expressão, garantia
inerente à democracia, consagra de forma inequívoca o direito do cidadão
expressar seu pensamento, assim como da imprensa cumprir com sua missão de
informar, ambos com suas respectivas responsabilidades. Rui Barbosa, além dos
predicados políticos e jurídicos que ornamentaram sua brilhante carreira,
também abraçou o jornalismo e em determinada conferência realizada na Bahia,
ressaltou:
“A
imprensa é a vista da Nação. Por ela é que a Nação acompanha o que lhe passa ao
perto e ao longe, enxerga o que lhe malfazem, devassa o que lhe ocultam e
tramam, colhe o que lhe sonegam, ou roubam, percebe onde lhe alveja, ou nodoam,
mede o que lhe cerceiam, ou destroem, vela pelo que lhe interessa, e se
acautela do que a ameaça.”
2 .A Lei de Imprensa do Brasil,
editada no período de exceção institucional, no julgamento da Ação de
Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 130, que tramitou pelo Supremo
Tribunal Federal, por maioria de votos foi considerada incompatível com a
Constituição Federal de 1988, deixando entender, no entanto, que o direito de
resposta ou de retificação nela contido, merecia ser preservado para aquele que
se sentir ofendido. Tanto é que, posteriormente, entrou em vigência a Lei nº
13.188/15, que regulamentou o direito de resposta ou retificação do ofendido em
matéria divulgada, publicada ou transmitida por veículo de comunicação social.
É interessante observar que o direito à liberdade de expressão, protegido
constitucionalmente pelo artigo 5º da Carta Magna brasileira, merece especial
atenção quando analisado perante o direito americano. (http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2016/10/deixa-o-povo-falar-diz-carmen-lucia-em-falar
sobre imprensa html. 2. Barbosa, Rui. A imprensa e o dever da verdade. São Paulo: Hunter Books,
2016, p. 31
É cediço que a democracia, para
atingir sua plenitude estabelecida no Estado Democrático de Direito, deve abrir
seus canais de comunicação para receber inúmeras vozes, divergentes ou não, mas
que possam expressar a vontade popular com os ideais voltados para a
concretização de uma sociedade fincada em sólidas bases, suficientes para
estabelecer o equilíbrio e a harmonia entre os cidadãos e o poder legalmente
constituído.
O filósofo norte-americano Ronald Dworkin
ensina, com maestria, a diferença entre liberdades negativas e positivas. As
primeiras consistem no homem não ser impedido pelos outros do que deseja fazer
como, por exemplo, a liberdade de falar sem censura, de dirigir em alta
velocidade (exemplos dados pelo próprio autor). Já as liberdades positivas se
caracterizam por ser o poder do homem em participar das decisões públicas e
controlá-las. Esta, de acordo com Dworkin, seria a democracia ideal, pois todos
os cidadãos governariam a si mesmos. Quando ocorre a confusão entre as
liberdades positivas e negativas ou então entre a liberdade com outros valores,
ensina Dworkin, que é possível então, através dessas limitações, entender como
funcionam os regimes autoritários. O fato é que este filósofo corrobora e
dissemina um dos ideais mais valorizados pelos Estados Unidos: a liberdade.
Pode-se dizer, que este país é um dos mais
liberais do mundo e defende com todas as forças a liberdade de expressão do
homem. A Primeira Emenda à Constituição dos EUA, que proíbe o Congresso de
elaborar qualquer lei que restrinja a liberdade de expressão ou da imprensa,
tornou-se mundialmente conhecida exatamente por isso. Em um caso ocorrido em
Indianópolis (Estado de Indiana, EUA), um grupo feminista defendia a criação de
uma lei que atenuasse a liberdade de expressão, alegando que essa falta de
limite explorava a pornografia contra a mulher, desvalorizando-a como um ser
social, gerando aumento da violência física e psicológica contra ela. Mais do
que depressa, as editoras e os cidadãos entraram com ação de
inconstitucionalidade, e a Suprema Corte dos EUA, invocando a Primeira Emenda,
decidiu que as alegações trazidas a juízo não justificavam a censura, mostrando
claramente que lá nos EUA a liberdade de expressão é quase que absoluta.
“Desde
a metade do século XX, confirma Lewis, ganhador do Prêmio Pulitzer, a idéia da
Primeira Emenda adquiriu uma influência poderosa na imaginação americana. Até
os conservadores, que antes se encontravam no lado repressivo das controvérsias
sobre a expressão, agora se juntam à exaltação da liberdade de expressão. As
pessoas invocam “a Primeira Emenda” como se aquelas palavras resolvessem seja
qual for a questão debatida.”
3. Os americanos pensam da seguinte maneira:
se as expressões heróicas podem ser manifestadas livremente (e quanto mais,
melhor), deve-se dar o mesmo tratamento para as de mau gosto também, afinal, de
acordo com eles mesmos, vivem em uma democracia moderna que coexiste
perfeitamente com a liberdade de expressão.
É claro que não se pretende comparar o modelo
brasileiro com o americano. Apesar das conquistas já efetivadas e muitas outras
para serem alcançadas, a afirmação da presidente do Supremo Tribunal Federal
ecoa com a ressonância necessária para retratar o anseio e o consenso da nação.
(Eudes Quintino de Oliveira Júnior,
promotor de justiça aposentado/SP, mestre em direito público, pós-doutorado em
ciências da saúde, advogado, reitor da Unorp; Gabriela Bellentani de Oliveira
Andrade, advogada, pós-graduada em Direito do Trabalho e mestranda em Direito
pela Instituição Toledo de Ensino – ITE – Bauru/SP)."